CPI aponta irregularidades em OS que fez gestão de hospital de campanha em SP

Iabas retirou profissionais de UBSs, diz relatório; prefeitura e organização afirmam que ação foi pontual

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São Paulo

O relatório final da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Quarteirizações da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) aponta irregularidades cometidas pela organização social Iabas (Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde), que fez a gestão do Hospital de Campanha do Anhembi, contratado pela Prefeitura de São Paulo para tratar infectados pelo coronavírus no início da pandemia.

Aprovado nesta quarta-feira (2) na Alesp, o relatório indica suspeitas de desvio de dinheiro público e possíveis fraudes trabalhistas, fiscais e previdenciárias, além da falta de transparência na divulgação dos contratos quarteirizados.

Ao analisar contratos firmados durante a pandemia, a CPI constatou que o Iabas retirou profissionais de UBSs (Unidades Básicas de Saúde) da capital paulista que funcionam sob sua gestão para reforçar o atendimento no hospital de campanha.

Para os deputados, ao receber recursos públicos para fazer a gestão do hospital de campanha e, posteriormente, usar médicos já contratados em outro contrato , o Iabas estaria recebendo a mais pelos serviços prestados.

O remanejamento de profissionais foi revelado pelo presidente do Iabas, Claudio Alves França, em depoimento à comissão. Ele disse ainda que a manobra foi necessária “para que os pacientes no hospital não ficassem desassistidos'', segundo o relatório.

O Iabas foi selecionado pela Prefeitura de São Paulo para fazer a gestão de 561 leitos do hospital de campanha, ao custo de R$ 75,2 milhões. Outros 310 leitos ficaram sob gestão da organização social SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina), com repasse de R$ 35,2 milhões.

Uma auditoria sob sigilo do TCM (Tribunal de Contas do Município) constatou que o quadro de pessoal contratado pelo Iabas para atuar no Anhembi era 20% inferior ao número de profissionais previsto.

Durante a auditoria, constatou-se também que uma UBS na região central de São Paulo estava fechada e que outra não tinha capacidade de atendimento da demanda local.

Os deputados também questionam pagamentos feitos pelo Iabas, revelados após quebra de sigilo bancário e fiscal da organização social. O acesso às finanças do instituto foi solicitada pela CPI após o Iabas estar entre as empresas investigadas nas suspeitas de direcionamento de licitações e propina envolvendo o governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).

O relatório aponta que a empresa OGS, contratada pelo instituto para fornecer profissionais para o hospital de campanha do Anhembi —o que já configuraria uma quarteirização—, não recebeu qualquer pagamento pelo serviço, segundo os documentos analisados.

“A se confirmar essa informação, duas hipóteses podem ter ocorrido: ou os pagamentos da OGS eram feitos por intermédio de outro prestador, transformando a empresa em uma ‘quinterizada’, ou aconteceram de maneira informal, via espécie”, diz trecho do relatório.

A quebra do sigilo mostrou ainda os seguintes pagamentos: R$ 300 mil para seis escritórios de advocacia; R$ 1,5 milhão para uma empresa de comunicação de eventos; R$ 3 milhões para empresas de consultoria; mais de R$ 100 mil para a Fundarj, que administra o Instituto Estadual de Hematologia Arthur de Siqueira Cavalcanti, no Rio de Janeiro; e R$ 252,3 mil para uma empresa de aluguel de veículos —esse valor, segundo o relatório, chama atenção porque o transporte de pacientes não seria uma atribuição do hospital de campanha. Foram identificados ainda dois pagamentos a uma empresa de turismo, em julho e agosto.

A análise dos documentos ainda mostrou que o presidente do conselho do Iabas, Cassiano Ricardo da Silveira, recebeu depósitos em sua conta corrente nos meses de abril, maio, junho, julho e agosto, pagos pelo instituto e identificados como “crédito salário”. Em depoimento à CPI, Silveira havia afirmado que os conselheiros do Iabas não recebiam salário, segundo o relatório.

As informações também foram encaminhadas para a Prefeitura de São Paulo, com quem o instituto firmou o contrato de gestão do hospital do Anhembi.

Iabas nega pagamento em duplicidade de profissionais remanejados

O Iabas informa, por meio de nota, que não foi notificado da conclusão do relatório da CPI, mas afirma que o remanejamento de profissionais foi necessário em razão do déficit de profissionais no mercado.

Os funcionários realocados, segundo o instituto, saíram de unidades em que os serviços estavam parcialmente suspensos por conta da pandemia e isso não impactou o atendimento.

O Iabas ainda afirma que não houve duplicidade no pagamento dos profissionais remanejados, pois os contratados para trabalhar no hospital do Anhembi estão discriminados na prestação de contas ou discriminados pelo prestador de serviços, “o que impossibilita também que o Iabas tenha recebido pagamento em dobro para executar a mesma função de determinado posto de trabalho”.

Quanto aos pagamentos a escritórios de advocacia, empresa de climatização, de consultoria e aluguel de veículos, bem como os bloqueios judiciais citados, o Iabas destaca que nenhum dos valores mencionados se refere ao hospital do Anhembi. “São todos fornecedores contratados pelo Iabas-RJ para prestação de serviços na capital fluminense, sem qualquer relação com os recursos oriundos dos contratos de São Paulo.”

O instituto ainda afirma que o transporte de pacientes transferidos do hospital de campanha estava previsto em contrato e o serviço foi executado durante todo o funcionamento da unidade.

Com relação à OGS, o instituto informa que a empresa prestadora de serviços médicos foi a Saúde Completa, que integra o grupo OGS, “cujos dados de pagamentos constam na prestação de contas à Prefeitura de São Paulo e o contrato foi disponibilizado à CPI”.

Sobre os salários pagos a Cassiano Silveira, o Iabas explica que o profissional, além de conselheiro, é assessor técnico bucal e a remuneração seria referente a esse vínculo empregatício, já que ele não recebe por presidir o conselho.

Prestação de contas ainda está em análise, fiz prefeitura

A Prefeitura de São Paulo informa, por meio de nota, que a prestação de contas do Iabas está em análise pela Secretaria Municipal da Saúde, com acompanhamento da Controladoria-Geral do Município, e os apontamentos do relatório serão observados na prestação de contas finais do hospital de campanha.

A gestão Bruno Covas (PSDB) afirma que o remanejamento de funcionários foi uma questão pontual, em razão da demanda, e não prejudicou o atendimento, pois os profissionais atuavam em unidades que estavam com atividades parcialmente suspensas por conta da pandemia.

Sobre a falta de pagamentos à OGS, a prefeitura diz que a empresa informada pelo Iabas na prestação de contas é a Saúde Completa Pronto Socorro e Clínica Médica Ltda.

Com relação aos pagamentos, a gestão tucana afirma que as "despesas de escritórios de advocacia, empresa de eventos, aluguel de veículos e bloqueios judiciais não estão relacionadas com os serviços prestados" pelo Iabas ao município.

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