Design Organizacional Especulativo

Design Organizacional Especulativo

1920 1080 Hugo Gonçalves

A fantasia é uma realidade à espera de ser ativada.

ANÓNIMO

Design Organizacional Especulativo

Outro dia estava com duas amigas e colegas de trabalho, a jogar conversa fora sobre desenvolvimento pessoal e espiritualidade, sobre relacionamentos e respetivas oportunidades e entrega, desafios e apegos, como conseguir estar no presente e desfrutar dos momentos e cenas do género.

A verdadeira conversa sobre a Vida ?, numa mesa repleta de papéis, canetas e marcadores, chávenas de chá e copos de vinho, ao som de música bem catita num dos meus Coffices na Baixa do Porto.

A uma dada altura, falávamos sobre de que forma a realidade, o dia-a-dia, o estar sempre envolvido em tarefas e processos e não ter tempo para explorar – mentalmente, emocionalmente e a nível da imaginação – outras possibilidades, nos retira a possibilidade de podermos ver, numa perspetiva de helicóptero, o que é que continua a fazer sentido ou não, o que é importante continuar, começar e deixar de fazer, e principalmente, deixarmo-nos embalar pelo éter e dar espaço às fantasias e possibilidades.

Comentei com elas que era importante darmos o nosso melhor para fomentar, proteger e mergulhar, no que a esse éter diz respeito. E saí-me com esta:

“Sabem, meninas, there is no room for reality. De vez em quando, não podemos dar espaço para a realidade” ?

Após um momento de silêncio mútuo, desatamos às gargalhadas. Mas tod@s validamos esta frase!

A fantasia, imaginação e quiçá mesmo a especulação são “abordagens” ou perspetivas às quais ainda não são dados os devidos valor, espaço, reconhecimento e recursos, a nível corporativo. Exceto na bolsa de valores, talvez (para a especulação)! ?

O episódio “orgânico” com as minhas amigas foi complementado com a “ciência” através de algo que me apareceu à frente nos dias seguintes – o Design Especulativo.

E é sobre os impactos, transformações e soluções que o Design Organizacional Especulativo pode trazer a ti, às tuas funções de líder, manager, profissional (desde as coisas mais estratégicas e operacionais), que hoje faço os meus habituais devaneios.

// DESIGN ESPECULATIVO – O QUE É

Foi um termo cunhado nos anos 90 pelos académicos de design Anthony Dunne e Fiona Raby, que escreveram o fabuloso livro Speculate Everything.

Estes autores afirmam que o Design Especulativo é um tipo de design que é usado como uma “ferramenta” para criar não apenas coisas, mas principalmente ideias, contextos, cenários, formas de estar e viver.

O Design Especulativo não é prever ou resolver problemas, é “ressignificar” a nossa perspetiva do que “ainda não é” para revelar possíveis futuros alternativos e trajetórias invisíveis de tendências culturais, tecnológicas, ambientais, sociopolíticas.

Ao contrário da investigação sistemática sustentada por dados, que tenta identificar futuros possíveis e prováveis, o Design Especulativo é segundo os autores “mais intuitivo, menos disciplinado e menos orientados para dados” e, portanto, levam o processo para além do esperado e “normal” para o desenvolvimento de produtos, serviços, business.

Ou seja, quem mais facilmente se souber levar pelos “vipes e viagens” poderá contribuir de forma mais intensa. ?

A abordagem e prática do Design Especulativo é uma estratégia particularmente estimulante para pesquisar o “espaço” que está além do “atual’ e do agora”.

O Design Especulativo não é utópico nem distópico. O futuro tem muitas tonalidades e é complexo porque somos imprevisíveis e contraditórios como Pessoas, em comparação com os consumidores perfeitos que achamos que somos (nós e os nossos clientes e utilizadores).

Também não é um mero exercício de fantasia, pois baseia-se no conhecimento das tecnologias e tendências existentes, utilizando o conhecimento de especialistas quando necessário.

O Design Especulativo exige que as pessoas suspendam a sua descrença e permitam que suas imaginações vagueiem. Abdicar deste “controlo”, lógica e racionalidade não é nada fácil, principalmente e especialmente quando estamos a falar de trabalho, produtos, serviços, equipas, organizações e dinheiro.

O objetivo do Design Especulativo é materializar e “encaixar” fragmentos de futuros possíveis e alargar os nossos horizontes. Encoraja-nos a pensar em futuros alternativos e a discutir qual a direção que devemos seguir.

É assim uma abordagem Human Centric e Existencialista, de Empatia através do Autoconhecimento e da Curiosidade com os Outros.

Pois trata-se de imaginar o que pode acontecer, estabelecer o que poderá ser melhor para as Pessoas e Mundo e então sim criar as melhores soluções, impactos e ideias.

Então, é como se estivéssemos a avançar e tentar ver algo que está completamente às escuras. Sabemos que vai certamente existir algo ali à frente, mas não sabemos bem (ou de todo ?) o quê.

Então o Design Especulativo pode ser uma espécie de lanterna, que usa o presente, o que sabemos e a utilização de todas as nossas habilidades técnicas, emocionais e relacionais como ponto de partida.

Assim podemos, num contexto interno e externo à organização, ter uma maior segurança, clareza e abertura ao processo de exploração da nossa imaginação e à criação de ficções sociais que poderão definir o futuro do nosso trabalho e organização. Essa lanterna pode muito bem ser o seguinte cone:

// DIMENSÕES DO DESIGN ORGANIZACIONAL ESPECULATIVO

FUTUROS PROVÁVEIS

É aqui que a maior parte de nós navega. Descreve o que é provável que aconteça, a menos que haja uma perturbação ou tumulto extremo. Tipo uma crise financeira, uma guerra global… ou uma pandemia global. ?

A forma como as ideias, projetos, inovações são avaliados também está relacionada com uma compreensão aprofundada dos futuros prováveis. Este é um espaço valioso para explorar, mas é muito orientado para o presente e para a correlação direta entre causa-efeito.

FUTUROS POSSÍVEIS

Estamos a falar do que poderia acontecer, mesmo que seja difícil de imaginar. O Possível vai além, para cenários extremos do que é cientificamente possível. Isso inclui utopias e distopias, sem nunca entrar no reino da fantasia.

Este espaço tem tudo a ver com o uso da ficção como ferramenta de reflexão, mas deve haver uma série crível de eventos que conectem até mesmo as situações mais extremas.

A dificuldade em encontrar essas conexões é o que faz com que futuros possíveis pareçam fantasia e não valiosos para explorar a nível organizacional, logo afastando os líderes, managers e profissionais deste exercício especulativo que certamente poderia, de forma proativa, “prever e resolver” de forma antecipada muitos problemas e desafios futuros.

FUTUROS PLAUSÍVEIS

Plausível refere-se ao que poderia acontecer. É onde o planeamento, a estratégia, os cenários e a especulação vivem. O Plausível começa a ponderar mais profundamente no espaço da exploração, não previsão.

O filtro para colocar um cenário neste cone é se vários futuros possíveis, incluindo forças macro como a economia ou a geopolítica, podem permitir que um negócio continue a sobreviver e prosperar.

FUTUROS PREFERENCIAIS

E, por último, os futuros preferidos, o Santo Graal do Design Especulativo. Preferido é onde tu colocas todos cenários que queres que se materializem.

Facilitando várias sessões, workshops e iniciativas de exploração de problemas, ideias e oportunidades, a nível estratégico, inovação, resolução de problemas e desenvolvimento de novas formas de trabalhar e de entregar valor, vejo isto acontecer muitas vezes.

Na parte inicial, os líderes, managers, profissionais não saem da sua bolha de função, departamento, processos.

Quando se permitem (e estou lá eu para ajudar também ?) e entram no helicóptero do Todo, das Pessoas e do Mundo, começam a perspetivar o que poderá fazer sentido e que permite ter um lucro com propósito.

E aí sim, os futuros preferenciais são muito mais conectados, consensuais, eficazes e eficientes para todos os envolvidos. 

Nesta última dimensão, as respostas ou a clareza são escassas. ?

Mas as conversas e habilidades e perspetivas e ideias partilhadas pelas equipas são riquíssimas.

Estratégia e Operações fundem-se. Clientes e Colaboradores são dimensões diferentes da mesma Humanidade. Lucro é Valor. Produtos e Serviços são Impactos e Soluções.

Com as abordagens de:

quem sabem podemos ter “donos” de mecanismos de esperança e libertação organizacionais da “opressão” que nós próprios como líderes, managers, profissionais construímos. ?

O ponto chave aqui é aceitar que entre cenários futuros prováveis e plausíveis existe uma realidade que é preferível. Se o futuro para o qual caminhamos se tornará ou não preferível é o cerne do trabalho que os designers organizacionais especulativos fazem.

É por isso que o Design Organizacional Especulativo é mais sobre levantar questões do que fornecer definições de como as coisas devem ser. É esse o papel dos facilitadores internos e dos agentes de mudança organizacional.

Não cabe a esses agentes da organização impor o que é e o que não é preferido. Cabe-lhes criar a maior clareza e exploração possíveis para que todos os envolvidos possam fazem a melhor escolha ou se possam preparar os vários possíveis.

Enquadrando isto nas temáticas das Pessoas e Organizações, se calhar podemos dar um passo além e arriscar ainda mais. Não em recursos, mas sim em Especulação Social e Organizacional.

Mergulhando na tal ficção social que falei!

Isto significa coisas como:

  • Procurar problemas onde ainda não existem ?, em vez de resolver os problemas atuais (que vemos ou que ainda estão invisíveis devido ao nosso débil Sensemaking);
  • Foco na Exploração das perguntas realmente importantes, mais do que as respostas e quais serão as soluções “ideais”;
  • Manter uma perspetiva de Organização como sendo um meio de Serviço às Pessoas e Mundo (impactos, soluções, ética, equilíbrio) em vez de apenas uma perspectiva de serviço ao negócio e organização (produtos, serviços, processos, recursos, gestão);
  • Ter como farol como o Mundo poderia ser, em vez de como o mundo é;
  • A raiz e propósito ser criar ficções sociais em vez de ficções científicas (enquadradas com organizações, produtos, serviços e tecnologias)
  • Pensar em Realidades e Futuros paralelos (como é que o mesmo produto, serviço e solução pode servir personas diferentes) em vez de criar um futuro e realidades unificados. ?
  • Enquadramo-nos no mundo (Pessoas, Emoções, Natureza, e tudo o mais) em vez de o querer mudar;
  • Pensar mais e em primeiro lugar nas implicações de determinada inovação, produto e serviço antes de se explorar as aplicações (valorizar ética antes de mercados). Como acho que é fácil de perceber, a inovação seguiu o caminho inverso e só agora estamos a preocuparmo-nos com as implicações;
  • Pensar no Cliente como sendo uma Pessoa e um Cidadão em vez de ser apenas utilizador ou consumidor.

// CODA

 Se calhar a ideia chave que te quero transmitir é que cada vez mais é importante Sonhar fora da Caixa. ? 

O poder das ideias é que elas podem ser inspiradoras, podem ser contagiosas e podem ser catalisadoras. Uma vez que imaginar e pensar não requer conhecimentos académicos ou técnicos e é praticamente livre, todos devemos ser encorajados a pensar e a sonhar sobre o nosso presente individual e, em última análise, com o nosso futuro coletivo, no contexto do trabalho e da organização.

Cameron Tonkinwise, diretor do Design Innovation Research Centre acha que:

“Imaginar algo que não implique futuro, ficção, especular, criticar, provocar, interrogar, sondar, conversar, jogar, é um design inadequado.”

Tem estudos este senhor. ?

Obrigado, Abraço e Fica Bem!

H

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